sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Desmonte Nissan Versa 4 Rodas

Por Péricles Malheiros | Foto Pedro Rubens | Estúdio Burti HD
A cada reunião para escolher um novo carro de Longa Duração, a equipe técnica de QUATRO RODAS é convocada. No fim de 2011, ao colocarmos o Versa na carta de intenções, o contra-argumento que se ouviu foi: “Carro japonês, sabe como é: nenhuma quebra acontece, a rede é sempre cordial e competente. Corremos o risco de ter um modelo monótono na frota”. Felizmente, logo percebemos o preconceito (no bom sentido) implícito no pensamento e optamos por botar à prova o modelo que, meses mais tarde, levou à formação de filas nas concessionárias. Outros meses e quilômetros se passaram e eis o Versa com um desmonte capaz de derrubar nossas ideias preconcebidas sobre previsibilidade.

Antes que a primeira ferramenta toque o carro, o desmonte prevê um check-up geral. O exame final inclui a rodagem de alguns quilômetros e tem dupla função: fornecer as impressões derradeiras e colocar o motor em temperatura de trabalho. Essa função cabe ao nosso consultor técnico e responsável pelo acompanhamento e desmonte dos carros de Longa Duração, Fabio Fukuda, da oficina Fukuda Motorcenter. O último trajeto ao volante deu a Fukuda importantes pistas do estado clínico do sedã. “Notei ruídos na dianteira e na traseira e, assim como o relato de alguns motoristas que pegaram o carro nos dois últimos meses, percebi uma vibração exagerada nas saídas.Vou dar especial atenção à análise de suspensões, coxins e embreagem”, disse Fukuda.
Na oficina, o sistema de diagnose eletrônica foi plugado na central, mas a varredura não trouxe nenhum registro de erro relevante, liberando o carro para a etapa seguinte, a verificação da pressão de combustível e óleo. Tanto uma como a outra se revelaram dentro das especificações da fábrica: 3,5 bars no sistema de alimentação e, no de lubrificação, de 1 bar em marcha lenta e 2,9 bars a 2 000 rpm. Os três números estão em conformidade, indicando funcionamento perfeito de bombas e dosadores de pressão.
A pressão de compressão dos cilindros – cujo valor mínimo tolerado pela fábrica é de 217,56 psi – também foi averiguada. O número final é o resultado da média de três medições. Respectivamente, os cilindros 1, 2, 3 e 4 ficaram com média de 215,14, 217,56, 215,14 e 212,72 psi. Ou seja, cilindros 1, 3 e 4 reprovados e 2 aprovado “de raspão”. A desmontagem posterior do motor revelou a origem do problema. Os cilindros foram vítimas de um “vazamento” do vizinho do andar de cima, o cabeçote. Os retentores de válvulas não cumpriram bem a função de manter o óleo longe das câmaras de combustão. Dessa forma, o lubrificante escorreu pela haste e se acumulou de uma maneira tão severa nas válvulas que parte dos resíduos se desprendeu e aderiu às zonas de assentamento, impossibilitando a vedação perfeita durante a fase de compressão dos cilindros. “A folga de entrepontas do anel de compressão dos quatro pistões estava dentro dos limites. Ou seja, o vazamento de pressão só ocorria por cima, por falha no assentamento das válvulas”, diz Fukuda. A contaminação da cabeça dos pistões corrobora a conclusão do consultor técnico.
Concentrado nas impressões obtidas no test-drive de despedida, Fukuda partiu para a análise dos coxins. Estavam todos em perfeito estado, sem sinais de ruptura ou ressecamento. A investigação, então, pendeu para a suspensão e embreagem. Na dianteira, três flagrantes: bucha posterior das bandejas rompida, folga na haste dos amortecedores e barra estabilizadora com ligações danificadas. Atrás, mais problemas: o retentor do amortecedor direito deixou o óleo vazar e chegou aos 60000 km com ação comprometida. A análise da embreagem elucidou o caso das vibrações nas arrancadas. “O disco terminou com espessura mínima de 1 mm, ou seja, abaixo dos 3 mm que a Nissan informa como tolerados”, disse Fukuda. Além de encontrar o culpado, a investigação expôs de uma só vez uma fragilidade técnica e outra de atendimento. Nenhum carro da história recente do Longa Duração terminou com o disco de embreagem ao menos perto do limite e, para agravar a situação, 78,2% da quilometragem do Nissan se deu em trechos rodoviários, onde a embreagem praticamente não é utilizada. “Se o índice de uso em perímetro urbano fosse maior, o carro certamente teria o desempenho no teste final comprometido”, afirma Fukuda. Pior: ao fazer a revisão dos 50000 km , aconcessionária Tokio não percebeu a vibração nas saídas, algo facilmente detectável com uma simples volta no quarteirão.
Dentes à mostra
Desmontado, o câmbio apresentou sinais de desgaste. O ronco alto com a primeira marcha acionada, similar ao que é produzido em ré (e destacado por muitos que se revezaram ao volante do sedã), vem, segundo Fukuda, de uma falha de projeto: “Os dentes da engrenagem da primeira estão com sinais de atrito nas faces internas”. O trambulador, componente que transmite para a caixa de câmbio a marcha selecionada pelo motorista com a alavanca, chegou aos 60000 km balançando demasiadamente. Aos 34643 km, a concessionária Itavema alegou ter trocado o trambulador, mas a chapa metálica que posiciona a alavanca estava danificada. “Há a possibilidade de a peça não ter sido substituída, apenas reposicionada”, diz Fukuda. Ao todo, o carro ficou parado 23 dias na Itavema.
Em contraponto ao desempenho ruim na análise de motor, câmbio e suspensão, o Versa saiu elogiado em itens como carroceria, acabamento e sistemas elétrico e de direção. “A forração do assoalho foi retirada e não achamos sinais de poeira ou água. Fiquei positivamente surpreso ao encontrar placas de isopor abaixo do carpete e, entre eles, uma camada de manta”, diz Fukuda. “Barras axiais e terminais de direção estavam sem folgas.”
A cabine espaçosa – especialmente no banco traseiro – sempre rendeu elogios por parte dos 27 usuários do Versa, mas o atendimento da rede foi marcado por episódios inusitados. Além de entregar o carro com o cabo negativo da bateria solto – o que nos fez ficar parados logo após a retirada –, a Kin Penha relutou em entregar o cabo de conexão para iPod. Na revisão dos 30000 km, desobedecendo o plano de manutenção da Nissan, a Sinal não fez a troca do filtro de combustível. Já o de ar teve a substituição negligenciada pela Kin Guarulhos na revisão de 40 000 km. Um outro filtro, de cabine, gerou polêmica. O componente original foi marcado assim que recebemos o carro, assim como diversas outras partes do carro. Após a revisão dos 20 000 km, feita na Fuji, descobrimos que a peça havia sumido. Só depois de muita conversa, a autorizada providenciou, em cortesia, a reposição do componente. A Nissan, após ver o relato do episódio publicado na edição de julho, manifestou-se oficialmente. Em comunicado, a empresa disse: “Por uma questão de definição de projeto, o NissanVersa não conta com filtro de cabine”.Após o desmonte, na concessionária Itavema, o atendente do balcão de peças viu o filtro de cabine do nosso Versa e disse: “Não é de nenhum Nissan”. Consultamos, então, a Filtros Brasil, fabricante de filtros de reposição. “Uma vez que a concessionária disse que o filtro encontrado no nosso Versa não pertence a nenhum Nissan, é possível concluir que se trata de um produto do mercado paralelo. Ou então fizeram uma adptação.
Aprovado, mas com restrições, o Versa mostrou que precisa passar por um processo de retenção de falhas técnicas e de serviço. É bom que a Nissan se mostre mais atenta aos filtros de qualidade. E que essa preocupação seja estendida à rede.
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APROVADO
Medida certa
Virabrequim chegou aos 60 000 km íntegro, com as medidas de diâmetro de munhões e moentes e de folga axial dentro dos limites estabelecidos pela fábrica.
Corpo são
O nível de contaminação
por resíduo de combustível no corpo de borboleta é compatível com a quilometragem.
Segurando todas
Ao contrário
das borrachas da suspensão, os coxins de sustentação do motor e do câmbio chegaram ao fim do teste em ótimo estado, sem sinais de ressecamento e muito menos de ruptura.
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ATENÇÃO
Pressão aliviada
As válvulas de admissão se mostraram com excesso de depósito de material carbonizado. ao se desprender, parte desse carvão ficou na região de assentamento, prejudicando a vedação.
O fino
Platô e atuador hidráulico estavam em perfeito estado, mas o disco chegou aos 60 000 km com espessura mínima (1 milímetro) abaixo do nominal, que é de 3 mm. a magreza excessiva era a responsável pela tremedeira nas saídas.
Bruxismo
A abertura do câmbio mostrou que anéis sincronizadores, garfos e luvas de engate estavam em ótimo estado. No entanto, a engrenagem da primeira marcha apresentava desgaste em todos os dentes.
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REPROVADO
Entrando pelo cano
O amortecedor traseiro direito teve problema no retentor: a sujeira de óleo na parede externa do tubo comprova que o fluido vazou. analisado fora do carro, ele mostrou-se quase sem ação.
Folga disfarçada
As bieletas pareciam íntegras a olho nu, mas o sistema rotular (envolvido pela parte de borracha preta) apresentou folga excessiva. boa parte do ruído na dianteira era culpa das bieletas.
Movimento alavancado
A chapa metálica do trambulador, responsável
por manter a alavanca do câmbio firme, se deslocou e deixou nosso versa parado por 23
dias. pior: há indícios de que a peça não foi trocada.
Na bucha!
A bucha posterior das duas bandejas estava rompida, provocando ruído constante na dianteira. a suspensão do versa definitivamente não
está preparada para nosso péssimo asfalto.
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PARALELO
O filtro de cabine
é responsável por reter impurezas e
até micro-organismos contidos no ar. A Nissan diz que
o Versa possui o encaixe para filtro, mas, por uma questão de projeto, ele vem vazio. Atento, o mercado paralelo oferece um elemento filtrante compatível com a dupla Versa e March.
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CHECK-UP
Quilometragem | 1 273 km | 60 000 km | Diferença (%)
0 a 100km/h (s) 11,4 / 11 / 3,51
0 a 1000m (s) 32,1 / 32,1 / =
3a 40 a 80 km/h (s) 6,9 / 7,3 / 5,8
4a 60 a 100 km/h (s) 10,5 / 11,2 / 6,67
5a 80 a 120 km/h (s)  15,3 / 14,9 / 2,61
Frenagem 60 km/h a 0 (m) 16,8 / 17,5 / 4,17
Frenagem 80 km/h a 0 (m) 29,9 / 30,5 / 2
Frenagem 120 km/h a 0 (m) 71 / 68 / 4,22
Consumo urbano (km/l) 8,2 / 8,4 / 1,45
Consumo rodoviário (km/l) 12 / 12 / =
Ruído interno PM (dBA) 37,7 / 36,7 / 2,65
Ruído interno RPM máx. (dBA) 70,7 / 70,8 / 0,14
Ruído interno 80 km/h (dBA) 60,3 / 59,6 / 1,16
Ruído interno 120 km/h (dBA) 66,7 / 66,7 / =
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FOLHA CORRIDA
Preço de compra: 43 990 reais (Janeiro/12)
Quilometragem total: 60 229 km
47 072 km (78,2%) rodoviário
13 157 km (21,8%) urbano
Consumo total: 6 499,8 litros de etanol (12 516,96 reais)
Consumo médio: 9,3 km/l
Custo por 1 000 km: 246,74 reais
10 000 km –
 149 reais (Grand Brasil)
20 000 km –
 299 reais (Fuji)
30 000 km – 225 reais (Sinal)
40 000 km –
 397 reais (Kin)
50 000 km – 274 reais (Tokio)

Peças extras às revisões - jogo
de tapetes, 78 reais; lâmpada
de farol de neblina, 153 reais; lâmpada do farol, 119 reais
Alinham., balanc. e rodízio – 650 reais
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HISTÓRICO
9 km: cabo da bateria solto
112 km: páginas do manual descolando
10 157 km: carpete do assoalho desfiando
27 891 km: Defletor de calor
encostando no cano de escapamento
34 643 km: Dificuldade de engate da ré
34 810 km: Dificuldade de engate da quinta
44 408 km: Lâmpada do farol
de neblina esquerdo queimada
52 779 km: Lâmpada do
farol direito queimada
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VEREDICTO
A história do Longa Duração mostra que problemas de câmbio, motor e suspensão não são, felizmente, muito comuns. Em nosso Versa, os três itens foram mal e a rede ofereceu
um serviço aquém da boa fama dos japoneses. Ainda assim, é preciso dizer: ele nunca deixou nenhum de nós na mão.